Bet com t mudo

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BET COM T MUDO... Quem me conhece, reconhece? Já me imagino receptora deste blog. Quem é esta mulher? Quem é esta Eli, Elisa, Betina, Betuska, Betî, resumida numa Bet com t mudo? Esta afirmação diminuta diz (ou desdiz?) uma identidade... Assim, quem sou eu? Sou (sim) uma idealizadora das pessoas, das relações, das amizades, das produções minhas e dos outros. Consequência: um sofrimento que perdura... na mulher crítica que procura saber e tomar consciência finalmente de quem é e do que ainda pode fazer (renascer?!) nesta fase da vida, um envelhecimento em caráter de antecipação do inevitável. Daí a justificativa do blog. Percorrer olhares, visualizar controvérsias, pôr e contrapor, depositar num receptor imaginário (despojá-lo do ideal, já que eu o sou!) uma escrita em que o discurso poderá trazer uma Bet com t falante... LEITURAS, ESCRITAS, SIGNATURAS...

terça-feira, 25 de junho de 2024

DESAFIOS DO IMAGINÁRIO (III)

 

Viagem à volta de mim mesma...


Transitando entre símbolos, mitos, alegorias, metáforas, fui armazenando linguagens nas dobras de um inconsciente inquieto.

Signos em decifração, sempre interessada pelo conhecimento e pelo fazer. Na espiral, entre descidas e ascensão, pude vislumbrar hiatos e incongruências.

Nesse lugar nenhum onde o movimento nos lança para além do real e da fantasia, dancei à beira do lago sagrado querendo nele mergulhar, me segurando em suas faldas voláteis.

Sonho de uma noite de primavera, antecipei o outono. Tempo passageiro como todos os tempos, acreditei na possibilidade da permanência.

Cronos não quis nem conversa. Estava muito distante e entretido entretempos. Conversei com Einstein, aquele mesmo que desdobrou o tempo.

Foi gentil, mas duro, tudo passa e retornará. Agora mesmo vou ali e aqui, ontem, hoje, amanhã. Onde você se situa? Merda para todos esses mitos que mais bagunçam do que me esclarecem.

Na literatura encontrei Próspero que me isolou na tempestade mágica e me fez aguardar a calmaria. Apenas metáfora de uma espera onde o real se confunde – e rima - com o imaginal.

Imagina eu? Queria o dom, o banho mágico para vislumbrar além do visível. Então retornei a caminhos dantes navegados, resvalando nos anelos de minha limitada espiral humana.

E pude acumular totens, na significação de tempos e descobertas que se superpõem. Alegorias de mim mesma, continuo nessa jornada, ainda ansiando a beatitude de todos os desfechos.

In illo tempore


Esclarecendo: o desenho é de minha autoria, como ilustração e referência de minha "jornada acumulativa" no curso sobre Imaginário. E usei, no topo, uma citação de Freud: 

"O totem é, em primeiro lugar, o ancestral comum do clã, mas também seu espírito protetor e auxiliar." 

E encontrei esse belíssimo poema de Léopold Senghor, ex-presidente do Senegal,  O Totem. Seu manuscrito em francês, traduções em português, inglês, italiano e em espanhol.

Acredito que não esteja muito legível nesta foto, reproduzida acima. Portanto, vou colocar a versão em português.

                                                         (tradução de Gastão Gomes)

                          E o original em francês: lembrando que o Senegal, África, foi colônia francesa.

                                                                                                       LE TOTEM

     Il me faut le cacher au plus intime de mes veines
l’Ancêtre à la peau d’orage sillonnée d’éclairs et de foudre
Mon animal gardien, il me faut le cacher
Que je ne rompe le barrage des scandales.
Il est mon sang fidèle qui requiert fidélité
Protégeant mon orgueil nu contre
Moi-même et la superbe des races heureuses...

(Léopold Sédar Senghor, Chants d’ombre, 1945)

...oooOooo...


sexta-feira, 7 de junho de 2024

DESAFIOS DO IMAGINÁRIO (II)

 

Era uma vez...

Uma mulher com 2024 anos de idade que regressava teimosamente aos exemplos e cultivo de deusas ancestrais, rainhas da luz e das trevas. Espirais do conhecimento, movimentos de idas e voltas nos embates com o mundo e reveses além do cotidiano, neles se enovelava.

Louvou Inana, exemplo da única mulher deusa que, antes do dilúvio, desceu aos infernos e dele voltou, refazendo seu destino. Invocada, Inana fez companhia a essa mulher que, volta e meia, nos círculos do tempo, abria portais e lutava em desespero pela vida e pelo amor.

No oco do corpo, um abismo foi construído. Ali encontrou o caminho da descida, degraus que a sustentavam e que se deterioravam com o aglomerado de mágoas e culpas. Dos olhos mágicos de Inana vinham os créditos da continuidade, ainda que o risco da queda fosse previsível.

Entre o céu e a terra em que navegava Inana, essa mulher achou que também podia ser uma deusa. Mas o abismo em que descera, também submergia sua onírica intenção. Assim, passou a louvar seu monstro interno, ela mesma, gostando de ser algoz e vítima.

Inana sabia o que essa mulher não sabia. Encontraram demônios e os mais perigosos ela lhe ensinou a esconjurá-los. Da revolta guardou pouco saber, mas aprendeu a continuar. Cicatrizes ficam cravadas nas artérias em circulação, labirinto em que se perdera, sem fio de resgate.

Inana, numinosa, proferiu o dito irreversível, enunciado repetido, sucessivo, vozes em coro, em solos, pelos séculos e séculos amém “eu sou a luz do mundo”. E se despediu dessa mulher que ficou presa na metáfora epifânica de si mesma.

Então ela começou a subir os degraus da volta. Pelo oco do corpo foi vendo o que construíra, em galhos e papel, preto e branco, em cores, legitimando o reverso de sua humana aceitação. A espiral ascendente resplandeceu para que essa mulher entendesse para que viera e caminhara séculos e séculos amém!


Foto tirada do livro:

Inana: antes da poesia ser palavra era mulher/Enheduana: traduzido do sumério por Guilherme Gontijo Flores, Adriano Scandolara. São Paulo: sobinfluencia edições, 2022. (p. 84/85)




(os deuses dialogam entre si...)